Opinião: “A redução do mandato de senador”

calendar 27 de março de 2023
user Larissa de Bem

Antônio Augusto Mayer dos Santos
Advogado e especialista em Legislação Eleitoral

Atribui-se ao antropólogo e senador Darcy Ribeiro (1922-1997) a autoria da frase “O Senado é o céu”. Apesar de algumas referências creditarem-na a outros integrantes da Casa Legislativa, o certo é que ao cogitar de uma versão da filial do Paraíso na Terra, o bordão traduziu não somente a convicção do autor, mas da maioria dos brasileiros acerca das benesses concedidas aos seus integrantes.

Diante disso, existem divergências, no parlamento e na sociedade, acerca do período mais apropriado para o mandato senatorial atualmente fixado em oito anos. Não se está questionando o relevo das competências senatoriais. Entretanto, o que não há mais, por fundados motivos, é a necessidade de oito anos para exercê-las. Os quatro que são prescritos aos deputados federais seriam para lá de suficientes aos senadores.

Registre-se que os argumentos para justificar tal período abundam. O primeiro deles está em que aludir a experiência acumulada em cargos anteriormente exercidos não justifica mandatos de oito anos. Isso é um resquício imperial. O que reveste de importância qualquer Câmara Alta mundo afora é o seu rendimento e a sua atuação em prol do país, jamais a extensão do mandato de seus integrantes.

Indo adiante, inexistindo outros mandatos eletivos que não sejam de quatro anos, há uma desconformidade na manutenção deste que corresponde ao dobro de todos os demais.

A pirâmide tributária erigida pela Constituição Federal de 1988, que encurralou tributariamente os demais entes federativos ao orçamento da União, é outro elemento a amparar a mudança preconizada. Essa situação, que comprometeu a autonomia dos Estados e Municípios, reconhecida sem maiores divergências pelos experts, também alvejou os oito anos atribuídos aos representantes dos Estados no Congresso Nacional.

Nesse norte, há que se admitir a ocorrência de uma severa desidratação do conceito clássico de “representação dos Estados” que ampara os longos mandatos senatoriais. Ainda que alguns insistam na retórica bolorenta de que o senador representa a unidade estadual e não o povo, isso é uma questão que nem os próprios senadores levam em conta no dia a dia. Afinal, atualmente, não persiste mais aquela divisão estanque entre as Casas. Existem infindáveis frentes municipalistas e temáticas atuando simultaneamente junto às duas. Através delas, deputados federais e senadores são mobilizados com a mesma intensidade por prefeitos e governadores em busca de recursos e soluções para as suas demandas e administrações.

Ao fim e ao cabo, o mandato em quadriênios é o que se apresenta mais condizente às mudanças em torno de maus costumes arraigados. Cinco anos, embora seja tolerável, implicaria em pleitos isolados, onerosos e muito provavelmente com índices consideráveis de abstenção. Seis anos seriam demasiados face à extensão alvejada. Períodos de quase uma década, como os atuais, ficam petrificados. Quatro anos é um lapso adequado, capaz, inclusive, de conferir maior proximidade do Senado à sociedade. A controvérsia reside, pois, numa adaptação à nova realidade, tal qual no Império, quando os liberais se evocavam contra a vitaliciedade dos senadores, conforme lembrado nas primorosas crônicas de Joaquim Maria Machado de Assis (1839-1908) no seu indispensável O Velho Senado.

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