Possíveis mudanças no Processo Legislativo: Poder, institucionalidade e novos rumos

calendar 18 de março de 2025
user Leonardo Barreto

A previsibilidade das decisões legislativas é um elemento essencial para qualquer ambiente político e econômico estável. No Brasil, a dinâmica da Câmara dos Deputados tem sido marcada, nos últimos anos, pelo uso recorrente de requerimentos de urgência, um mecanismo que permite que projetos avancem diretamente ao plenário sem a tramitação tradicional pelas comissões temáticas. Esse modelo acelerado garantiu agilidade a pautas prioritárias, mas também concentrou poder e reduziu a capacidade de interlocução de diversos setores interessados no debate.

Agora, sob nova liderança de Hugo Motta, a Câmara discute mudanças estruturais no seu regimento interno, buscando equilibrar a necessidade de eficiência com maior previsibilidade e institucionalidade no processo legislativo. As propostas em análise não apenas afetam a governança política, mas também redefinem os vetores de influência no Congresso e, consequentemente, o ambiente de negócios no país.

As propostas em discussão: um novo equilíbrio de forças

O debate gira em torno de três propostas centrais, cada uma delas com implicações distintas para a interlocução política e para a dinâmica legislativa:

  1. Maior controle partidário sobre as comissões – permitiria que partidos substituíssem os presidentes das comissões a qualquer momento, reforçando a influência das lideranças sobre a tramitação de projetos. A medida poderia resultar em maior alinhamento estratégico dentro das bancadas, mas também reduzir a independência dos colegiados.
  2. Filtro constitucional obrigatório antes da tramitação – toda proposição legislativa passaria primeiro pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), e apenas os projetos considerados constitucionais avançariam para a análise de mérito. Embora a medida reforce a segurança jurídica, pode criar um novo gargalo na tramitação legislativa, dificultando a evolução de temas estratégicos.
  3. Limitação do trâmite a uma única comissão de mérito – atualmente, um projeto pode passar por múltiplas comissões, o que amplia a participação de diferentes setores no debate. Com a nova proposta, cada projeto seria direcionado apenas para a comissão considerada mais relevante para seu tema. A mudança reduziria a fragmentação do processo decisório, mas poderia comprometer a análise multidisciplinar de matérias complexas.

Essas possíveis mudanças reconfiguram o acesso à tomada de decisão, redefinem o fluxo de poder dentro da Câmara e alteram a forma como atores políticos e empresariais se posicionam no debate legislativo.

Impactos para o setor privado: entre a previsibilidade e o fechamento de espaços

Para o setor privado, a previsibilidade legislativa é um fator determinante. Empresas e setores regulados estruturam suas estratégias com base na compreensão do processo decisório e na capacidade de antecipação de mudanças regulatórias. O desenho atual da tramitação parlamentar já impõe desafios para quem busca segurança e estabilidade na formulação de políticas públicas, e as mudanças propostas podem intensificar essa dinâmica.

Se, por um lado, um processo mais estruturado pode proporcionar um ambiente regulatório mais transparente e menos sujeito a decisões concentradas, por outro, a maior centralização no controle partidário e o enrijecimento da tramitação podem reduzir os espaços de interlocução. Isso exigirá, de empresas e setores estratégicos, uma capacidade ainda maior de articulação e influência, antecipando cenários e fortalecendo sua presença nos debates que moldam o futuro regulatório do país.

Um novo Congresso, um novo cenário de influência

A reformulação do processo legislativo na Câmara não é um movimento isolado, mas parte de um redesenho mais amplo das forças políticas no Brasil. Com um cenário institucional em constante evolução, a necessidade de inteligência estratégica e atuação qualificada se torna ainda mais evidente para todos os agentes que interagem com o setor público.

O Grupo Voto segue acompanhando de perto essa agenda, analisando seus desdobramentos e provendo insights estratégicos para líderes que precisam estar à frente das transformações políticas e econômicas do país.

Afinal, em um ambiente de mudança, não basta acompanhar o jogo – é preciso saber como influenciá-lo.


Análise realizada por Leonardo Barreto – Graduado, mestre e doutor em Ciência Política pela UnB, Leonardo é analista de risco político e sócio da Think Policy, empresa especializada em auxiliar o setor privado na compreensão e colaboração com políticas públicas. Autor do livro Regras Novas, Jogadores Antigos, publicado pela Aberje, tem ampla experiência como professor universitário em diversas instituições e como consultor de partidos políticos, empresas e associações empresariais. Ao longo de sua trajetória, conduziu mais de 60 estudos de opinião com parlamentares e outras autoridades.

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