Leonardo Barreto é Doutor em Ciência Política (Universidade de Brasília) e diretor de conteúdo da Vector Relações Governamentais
(@LeonardoCapPol)
A anulação das condenações contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva terá repercussões importantes sobre o sistema político e o andamento do governo do presidente Jair Bolsonaro. A principal delas é uma indecisão presidencial sobre como conduzir seu governo entre alternativas de política econômica. O pior cenário para ele, no entanto, é não fazer nem uma coisa nem outra, perdendo totalmente suas bases de apoio.
Considerando que é cedo para dizer que a candidatura de Lula favorece Bolsonaro ao promover uma eleição de arqui-inimigos, é preciso lembrar que os eleitores não ideológicos, aqueles que decidem pleitos majoritários, julgam resultados de governo. Nesse sentido, a preocupação deve estar voltada para a agenda e a cronometragem dos seus resultados de curto e médio prazo.
Não colabora nada para o governo que a decisão tenha vindo ao pior momento do presidente em termos de popularidade, com o país com a economia parando novamente, ritmo lento de vacinação, inflação e sem auxílio emergencial. No entanto, o Planalto precisa perceber que pelo menos duas dessas variáveis (auxílio e vacinação) melhorarão nos próximos dois meses.
A questão mais importante, portanto, passa a ser juro e retomada dos empregos.
Nesse sentido, é preciso observar o comportamento de Jair Bolsonaro. O presidente, que tem mostrado dificuldades de sustentar uma política ortodoxa na economia e pode pender para o grupo mais heterodoxo que o cerca, que defende algum relaxamento fiscal e investimento público para animar o mercado de trabalho.
Em termos de agenda, isso pode significar a retirada de apoio de qualquer tema que desagrade potenciais eleitores, como privatizações (Correios e Eletrobras) e a reforma Administrativa. Mesmo a PEC Emergencial, aprovada com dificuldade no Senado Federal, corre risco de alguma desidratação.
O problema é que, ao fazer isso, Bolsonaro se parecerá mais com administrações do PT e perderá de vez a confiança do mercado e de eleitores liberais, que foram responsáveis pelo presidente extrapolar o nicho ideológico e ganhar a eleição (os lavajatistas já foram perdidos). Ao ficar entre dois caminhos, ele corre o risco de não fazer nem um governo desenvolvimentista e nem uma gestão liberal, repetindo a trajetória do ex-presidente argentino Mauricio Macri.
Se olhar com atenção, Bolsonaro verá que sua real alternativa de gerar resultados no curto prazo é acalmar o país, oferecer perspectiva concreta de retomada econômica e aproveitar a boa condição no Congresso Nacional para acelerar reformas. Nenhum gasto com obras ou adicional de auxílio emergencial conseguirá ter efeitos que cheguem a 2022. O momento, portanto, é de tranquilizar o mercado para suavizar a cotação do dólar, combater a inflação e tornar a curva de juros futuros menos íngreme para não comprometer a retomada da atividade produtiva.
Enquanto o presidente Bolsonaro não reduz as dúvidas quanto ao seu posicionamento, o país depende mais do que nunca do Congresso Nacional como ator de contrapeso. O problema é saber se Arthur Lira (PP/AL) e Rodrigo Pacheco (PP/AL) não terão condições e recursos políticos para segurar bases parlamentares contra tentações populistas se o Planalto não estiver com eles.
Em resumo, a anulação da condenação de Lula gerou uma combinação de antecipação da corrida eleitoral que é nociva para um país com fragilidade fiscal e um governo que alimenta dúvidas sobre a política conduzida pelo seu ministro da Economia. Como mostrou a Argentina, ficar pelo meio do caminho pode ser a pior opção para Bolsonaro.